Congresso do Brasil desfere grande golpe aos direitos indígenas e à governança ambiental | Amazon Watch
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O Congresso do Brasil dá um grande golpe aos direitos indígenas e à governança ambiental em uma mudança dramática de política, enquanto o governo Lula se posiciona

25 de maio de 2023 | Para divulgação imediata


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Deputados apoiam Célia Xakriabá em seu discurso contra o PL 490.

Ontem, 24 de maio de 2023, uma comissão parlamentar brasileira aprovou por maioria esmagadora, por 15 votos a 3, o projeto de lei, conhecido como Medida Provisória 1154, do deputado Isnaldo Bulhões Jr. A medida muda a estrutura administrativa socioambiental do governo do presidente brasileiro Lula, retirando a autoridade do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) para demarcar ou reconhecer legalmente os territórios indígenas. A votação devolve essa responsabilidade ao Ministério da Justiça – ao mesmo tempo em que revoga o controle do Ministério do Meio Ambiente (MMA) sobre os recursos hídricos e o cadastro ambiental rural do Brasil, uma ferramenta fundamental na luta contra o desmatamento ilegal e a grilagem de terras. Ao fazer isso, os legisladores brasileiros reverteram o MMA à sua estrutura da era Bolsonaro.

Na quinta-feira, 25 de maio de 2023, à tarde, representantes de organizações da sociedade civil – incluindo Amazon Watch – enviou um manifesto aos líderes do Congresso Nacional do Brasil. O manifesto, assinado por 790 entidades, se opõe às substituições ministeriais previstas na MP 1154.

Em um contínuo ataque aos direitos indígenas, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, anunciou ontem à noite sua intenção de permitir a votação do Projeto de Lei (PL) 490/2007 na próxima terça-feira, após votação em plenário que aprovou amplamente que esta legislação avance como uma questão de urgência. A natureza acelerada dessa legislação pode prenunciar o provável resultado da votação da próxima semana, que pode abrir um precedente legal conhecido como "Prazo” ou “Limite de tempo,” liderado pelo lobby do agronegócio brasileiro para limitar severamente o direito dos povos indígenas aos seus territórios ancestrais. Se aprovada, a legislação impediria uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a tese do “Prazo”, prevista para 7 de junho de 2023.

Sonia Guajajara, chefe do Ministério dos Povos Indígenas do Brasil, disse: “O presidente Lula trouxe a agenda indígena para o primeiro plano de sua campanha eleitoral, comprometendo-se a retomar o processo de demarcação das terras indígenas. Foi com esse intuito que foi criado o Ministério dos Povos Indígenas. Mas agora, assistimos a este Congresso lançando um ataque em grande escala a este Ministério, em um país que levou 523 anos para reconhecer a importância dos povos indígenas e menos de cinco meses para tentar nos silenciar e nos controlar novamente. O mundo inteiro tinha grandes expectativas de que o Brasil pudesse retomar seu protagonismo no combate à crise climática. A comunidade internacional espera que o governo brasileiro implemente políticas efetivas para eliminar o desmatamento e proteger o meio ambiente. Se continuarmos atacando o principal aliado na luta contra o desmatamento, corremos o risco de perder toda a credibilidade internacional que tanto trabalhamos para reconstruir.”

O presidente da Câmara, Arthur Lira, decidiu unilateralmente acelerar a votação do projeto de lei em colaboração com o agronegócio e legisladores de direita, ignorando o conselho de liderança, onde tais decisões são normalmente discutidas. Lira já havia manifestado a intenção de levar a proposta adiante para evitar que o STF tome uma decisão antes da Câmara dos Deputados, embora o projeto ainda precise de aprovação do Senado.

Ana Carolina Alfinito, Amazon Watch Assessor Jurídico, disse: “O Projeto de Lei 490 que o Congresso está tentando aprovar violentamente é uma violação flagrante da Constituição Federal e dos tratados internacionais que foram ratificados pelo Brasil, os quais reconhecem claramente os direitos dos povos indígenas às suas terras tradicionais. O Congresso não tem poder para aprovar um 'truque de limite de tempo' inconstitucional que impedirá a demarcação de quaisquer terras indígenas no futuro, comprometerá aquelas que foram reconhecidas e terá impactos prejudiciais de longo prazo na mitigação das mudanças climáticas. Estamos testemunhando mais um ataque aos direitos indígenas e ao estado de direito.”

À medida que os eventos de ontem se desenrolavam, a notável ausência de resistência do governo Lula a uma reestruturação parlamentar das funções de seu ministério chamou a atenção de todos. A flagrante falta de resposta expôs a falta de autoridade do governo e seu controle limitado sobre a organização de seus próprios ministérios.

Enquanto as ministras Marina Silva (MMA) e Sonia Guajajara (MPI) denunciaram as medidas em meio à raiva e ao alarme de que os membros do governo Lula pouco fizeram para se opor às mudanças, Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, chamou a atenção por elogiando a atuação do deputado Isnaldo Bulhões Jr. na terça-feira. Enquanto isso, a bancada do Partido dos Trabalhadores no Senado celebrado uma vitória retumbante na aprovação do comitê do Congresso, compartilhando ansiosamente sua alegria nas mídias sociais.

Ana Paula Vargas, Amazon Watch Diretor do Programa Brasil, disse: “A presidência do Brasil pode ter mudado, mas um sentimento antiambiental e anti-indígena profundamente enraizado persiste no Congresso. Os acontecimentos de ontem revelaram essa brecha dentro do governo, que se estende ao Executivo e ao Partido dos Trabalhadores. O sucesso de Lula em reduzir o desmatamento e facilitar a luta do Brasil contra a mudança climática depende de seu apoio às ministras Sonia Guajajara e Marina Silva e do fortalecimento de órgãos indígenas e ambientais. O Brasil corre o risco de mudar rapidamente de um governo esperançoso para um que continua com políticas destrutivas, um caminho que a floresta amazônica e outros biomas não podem suportar por mais quatro anos.”

Mais informação

Projeto de Lei 490/2007

Atualmente, em tramitação, o Projeto de Lei 490/2007 apresenta uma grande ameaça aos direitos e bem-estar das populações indígenas no Brasil. Essa proposta de legislação busca cercear significativamente a demarcação de terras indígenas, valendo-se da polêmica tese do Marco Temporal.

Essa doutrina, engendrada pelo lobby do agronegócio brasileiro, efetivamente minimiza os direitos territoriais dos povos indígenas ao afirmar que eles só podem reivindicar terras que ocuparam a partir de outubro de 1988, época da promulgação da Constituição brasileira. Essa doutrina, vista por muitos como flagrantemente inconstitucional, não só ameaça a futura demarcação dos territórios indígenas, como também põe em risco os territórios atualmente reconhecidos.

Além disso, o Projeto de Lei 490/2007 abre territórios indígenas para atividades potencialmente prejudiciais, incluindo mineração dentro de Terras Indígenas. Transporte de operações de mineração várias implicações adversas para os povos nativos, abrangendo a propagação de doenças, contaminação por mercúrio, escalada de conflitos e violência e exploração e abuso sexual. A Terra Indígena Yanomami, a maior do país, vive atualmente uma crise humanitária em grande parte devido a invasões de garimpos ilegais. Nos últimos quatro anos, as invasões foram associadas à morte de pelo menos 570 crianças por desnutrição e doenças respiratórias, entre outros problemas, segundo a agência Sumaúma. Reconhecendo a gravidade desta crise, o governo Lula declarou Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional na área desde janeiro. Além desses desenvolvimentos alarmantes, o projeto de lei representa um grave perigo para Populações indígenas vivendo em isolamento voluntário. Ameaça o contato potencial, inclusive por terceiros, como missionários religiosos, quando considerado um assunto de “interesse público”.

Medida Provisória 1154

O relatório do deputado Isnaldo Bulhões Jr. apresentado na terça-feira, dia 23 de maio de 2023, na Câmara dos Deputados sobre a Medida Provisória 1.154 é um retrocesso.

A nova minuta retira instrumentos significativos de política ambiental do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA), transferindo-os para ministérios maculados por interesses políticos e empresariais e sem a necessária competência técnica, além de esvaziar as atribuições do Ministério dos Povos Indígenas.

Entre os pontos críticos do relatório estão:

  • A retirada do MMA da gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR), importante instrumento de monitoramento e gestão ambiental e de combate à grilagem e invasão de terras indígenas, transferindo a responsabilidade para o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos. Isso criará dificuldades na utilização dos dados e na gestão do sistema, afetando o processo de regularização ambiental das propriedades rurais do país, que está em andamento;
  • A retirada da demarcação de terras indígenas do Ministério dos Povos Indígenas para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, extinguindo a autoridade deste novo ministério;
  • A transferência da Agência Nacional de Água e Saneamento Básico (ANA) e do Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos (SIGRH) do MMA para o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, fragilizando a urgente integração da política de recursos hídricos com a política ambiental;
  • A mudança da Gestão de Resíduos Sólidos do MMA para o Ministério das Cidades;
  • A transferência do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento para o Ministério das Cidades.

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